domingo, 2 de setembro de 2007

Poema do Cacto

Havia um cacto em minha varanda. vida estranha essa de cacto. sempre indiferente, de poucos amigos. de textura áspera e tardia. de um verde esquivo, quase não-verde, nãoseiquê.
Nunca recebia muita atenção, nem mesmo precisava. era cirurgicamente independente em seus não-gestos. pouca água pouca água, quase gotas somente. porém não era despersonalizado, havia algo em seu existir. talvez amplitude do observar. talvez dormência.
Duvidei da sua estrutura. parecia gesso desprovido de vasos, clorofila ou qualquer substância orgânica que lhe configurasse vida. estranha beleza quieta, sua indiferença magnética atraía meu olhar. por vezes num sobressalto percebia: Era um Cacto! e existia. e tentava -Vamos, reaja, exista!.
Nunca encontrei ressonância. sua linguagem era apática e lenta. e surda.
Numa tarde de um janeiro quente, tarde aleatória, encontrei o Gato um tanto ferido com cara de culpa e preocupação, ferido por espinhos. no chão, próximo à janela da qual nunca pretendera sair, estava o Cacto em pedaços, como gesso, porém não o era. era vivo. agora fragmentos.
Apanhei-o respeitosamente.
Pasmo percebi o por-do-sol da janela que não era minha. era dele, do Cacto. e a vida da cidade inexistente, suas gentes invisíveis de trajetos automáticos. e o mar... imponente, esse sim existia.
Naquele instante meus olhos-de-cacto viram o que ele via. o movimento singelo do mar... e, talvez como o Cacto, senti ânsia de ser Alga-Marinha.
E boiar.
boiar...
boiar...

4 comentários:

Poeta impar disse...

"Lembranças"

E lá estava ela,
Bem mais ornamentada
Que da ultima vez,
Com um colar de
Bolinhas rosa
E um belo sorriso
De Metal!
Lembrei-me de nossa conversa:
- Ponha as duas mãos no pescoço...
- Aperte, aperte, aperte...

E pude sentir um pouco do que é o infinito...


J.Fábio 8-9/07/2006.

Unknown disse...

me identifiquei com o cacto

disse...

que saudade de você.

e.m. disse...

boiar até alcançar a nau ao mar..

gostei. abraços.

eder